Carlos Estellita-Lins concede entrevista – o sentimento é um sinal

Pesquisador em saúde mental alerta para o suicídio entre adolescentes

10---Bulling

Uma série do Netflix mobiliza as redes sociais desde que foi lançada no Brasil, em 31 de março. ‘13 Reasons Why’ (“Os 13 porquês”) conta a história de uma adolescente que comete suicídio e deixa 13 fitas gravadas com os motivos que a levaram a esse desfecho. Tamanha repercussão vem de encontro ao crescimento das taxas de suicídio no país. Carlos Estellita-Lins, psiquiatra da infância e adolescência, psicanalista e pesquisador em saúde mental da Fiocruz, ressalta que pesquisas apontam para o papel decisivo da escola no combate ao bullying e recomenda aos pais: estejam por perto.

O Mapa da Violência, organizado pelo Ministério da Saúde, mostra que, entre 2002 e 2012, o número de suicídios na faixa etária de 10 a 14 anos aumentou 40%. Entre 15 e 19 anos, cresceu 33%. Temos um problema de Saúde Pública?
Quando se fala que suicídio é problema de Saúde Pública, isso quer dizer que: interessa a muitos e tem alcance geral; qualquer um pode ter que lidar com isso; é assunto de governo e dever do Estado; e a saúde não está apenas dentro do corpo, ou na intimidade secreta das neuroses, mas é interação.

Segundo a OMS, o Brasil é o oitavo país em número de suicídios. Em 2012, foram 11.821 mortes (6 a cada 100 mil habitantes). Quais fatores mais influenciam nesses desfechos?
Os problemas de saúde mental estão presentes em mais de 90% dos suicídios no mundo. No adulto, a depressão e o uso de álcool e drogas estão fortemente associados. No jovem, também devemos observar o início da esquizofrenia (ou outras psicoses) e várias formas de violência que desencadeiam distúrbios psiquiátricos, com ansiedade extrema, como abuso sexual, bullying, pânico e estresse pós-traumático. A maconha já é assunto de absoluta conexão com transtornos mentais em adolescentes – seja desencadeando ou produzindo um quadro mental, seja como automedicação ‘remendada’ e perigosa.

A omissão da escola diante do bullying é abordada na série ‘13 Reasons Why’. Como melhorar essa vigilância?
Inúmeras pesquisas apontam para o papel decisivo da escola no manejo de situações de bullying. A maioria das escolas busca negar, minimizar ou esconder os eventos, infligindo à vítima um tempo de sofrimento que seria precioso para a superação da crise e o aprendizado de todos. Muitos pais retiram seus filhos da escola. Caberia, ao contrário, realizar intervenções inclusivas.

Quando o jovem não consegue reagir, mas pede para os pais não intervirem. O que fazer?
Os pais geralmente sabem como ajudar, mas podem estar sendo atrapalhados por seus próprios problemas. A privacidade ou a autonomia de uma pessoa em sofrimento extremo pode ser momentaneamente suspensa ou relativizada. A intervenção dos pais, auxiliados por profissionais, costuma ser decisiva. Um rótulo de timidez pode ser tão nocivo quanto um diagnóstico apressado de distimia (tipo de depressão juvenil). Psicoterapia, medicamentos e mudanças corajosas no estilo de vida continuam sendo os pilares da psiquiatria.

Como diferenciar uma crise da adolescência de um quadro de depressão?
A depressão na adolescência não funciona do mesmo modo que nos adultos. É possível que muitas depressões sejam apenas crises e vice-versa. O que importa é manter contato, diálogo e atenção. O retraimento social e o prejuízo das capacidades adquiridas ou do rendimento escolar ainda são critérios simples e úteis.

O adolescente dá sinais de que vai cometer suicídio?
Verifica-se a experiência de desesperança e abandono. O sofrimento é o maior sinal.