Bonita ‘que só a gota’ – paraíba

Prepare-se para colecionar boas recordações dessa cidade

TEXTO: Por FELIPE RESK/agência estado | FOTOs: divulgação
TEXTO: Por FELIPE RESK/agência estado | FOTOs: divulgação

De um dos litorais mais bonitos do Nordeste à cidade que menos chove no país, a Paraíba tem muito a ser explorado. O Estado, no meio caminho entre Pernambuco e Rio Grande do Norte, aposta em paisagens naturais impactantes para atrair turistas o ano todo. Sim, tem o pôr do sol para fotografar e praias de areia branca e água transparente para coroar as tardes de verão. Mas não só. Prepare-se para conhecer pessoas espontâneas e acolhedoras, apreciar uma gastronomia de qualidade e colecionar boas recordações.
Simpática, a orla de João Pessoa oferece diversos bares e restaurantes que servem comida típica e petiscos à beira-mar, capazes de fazer esquecer, sem muito esforço, que esta é uma cidade com mais de 800 mil habitantes, com seus dilemas e vícios de metrópole. Com patrimônio histórico enriquecido por casarões e igrejas coloniais, a capital paraibana está localizada no limite oriental das Américas. É na Ponta do Seixas onde o sol nasce primeiro.
Espalhados pela região metropolitana também existem muitos locais para curtir. No pequeno município de Conde, as praias paradisíacas não se resumem a Tambaba, ícone do naturismo no Brasil. Há redutos praticamente intocados pelo homem, paisagens impressionantes e passeios divertidos a bordo de um quadriciclo. Às margens do Rio Paraíba, em Cabedelo, ocorre diariamente o pôr do sol ao som de Bolero de Ravel, um dos mais populares e tradicionais espetáculos do Estado.

CATAMARÃ
Na Paraíba, quem diz que um clássico nunca muda está errado. O famoso espetáculo do pôr do sol na Praia do Jacaré, responsável por reunir centenas de turistas todos os dias em Cabedelo, cidade vizinha ao norte de João Pessoa, foi repaginado – não sem protestos, é verdade.
Os bares sobre palafitas, que por anos disputaram clientes interessados em acompanhar o crepúsculo às margens do Rio Paraíba, não existem mais. Agora, são os catamarãs que assumiram o posto de camarote do evento e praticamente tomam conta da atração mais popular do Estado.
Uma coisa permanece igual: a trilha sonora. Com mais de 5,7 mil apresentações no currículo, o músico Jurandy do Sax continua executando o Bolero de Ravel, composição do francês Maurice Ravel (1875-1937), de dentro do rio, enquanto o sol vai se escondendo atrás da mata ciliar. Às 17 horas, ele surge a bordo de uma canoa, com o cabelo amarrado em um rabo de cavalo e vestido de branco da cabeça aos pés (exceto pelo lenço amarelo que traz no pescoço). Parecendo entrar na dança, gaivotas cortam o céu, e o rio vai se tingindo de dourado. A cena resume um pouco a beleza da Paraíba.
Então agitados por quadrilhas e apresentações de forró, os catamarãs ficam quietinhos para ouvir Jurandy tocar. Ele passa a maior parte dos 15 minutos da música ziguezagueando na frente das embarcações. Ao fim, sobe de um em um, onde se apresenta, fala um pouco dos mais de 16 anos de Bolero de Ravel ao pôr do sol e executa mais três ou quatro canções. Nem se compara à atenção prestada aos que ainda preferem ficar em pé no calçadão da margem, muito menor.
No catamarã, as atrações começam antes de o sax de Jurandy emitir a primeira nota, que também será reproduzida nas caixas de som dos barcos. As primeiras embarcações começam a sair às 16 horas e iniciam um tour pelo Paraíba. O clima é de muita descontração, com guias turísticos bem-humorados e músicos.
O passeio atrai crianças, adultos e idosos. O ideal é comprar o ingresso com antecedência, porque há risco de lotar – os hotéis têm indicações. Um dos pontos altos é quando Lampião e Maria Bonita, dançarinos profissionais, convidam os turistas para o forró. Apesar de a fantasia de cangaceiro soar meio fake em um catamarã, a risada é garantida. Depois, o grupo forma uma quadrilha animadíssima, especialmente porque são poucos os que realmente dominam a dança.

Os catamarãs são os camarotes para o espetáculo do pôr do sol na Praia do Jacaré
Os catamarãs são os camarotes para o espetáculo do pôr do sol na Praia do Jacaré

VENTO E POEIRA NO ROSTO
Capacete ajustado, é só assumir o controle. É possível sentir a brisa do mar no rosto e acompanhar a paisagem mudando em questão de minutos. Cânions, praias desertas, o encontro do rio com o oceano, tudo ao alcance do tour a bordo de um quadriciclo pela cidade de Conde, a 19 quilômetros de João Pessoa.
Fácil de operar, o quadriciclo dá autonomia aos turistas, não exige Carteira de Habilitação e proporciona um perspectiva diferente para admirar o cenário e curtir as praias. Com a vantagem de que os roteiros também podem ser feitos à noite.
O tour guiado de três horas da empresa RedRock custa R$ 160, para duas pessoas por veículo. O grupo parte do restaurante Tropicália, o ponto de encontro na Praia de Coqueirinho. A partir dali, será preciso percorrer estradas de terra para acessar alguns locais. Use óculos de sol para proteger os olhos da poeira.
Seguimos todos para a área dos cânions, formados a partir da erosão. Ao se aproximar, a terra vai mostrando uma paleta de cores. Lado a lado, os cânions formam um vale em tons de laranja, lilás e branco, pontilhado pelo verde da vegetação.
Esta parte do trajeto exige pouco do condutor. Aproveite para pegar o jeito no quadriciclo, que demora um pouco mais do que um carro para responder ao comando da direção.
Uma das cenas mais marcantes da viagem é o Mirante do Dedo de Deus, falésia que oferece uma visão panorâmica da divisa entre as praias de Coqueirinho e Tabatinga. Do alto se vê toda a faixa de areia branca, os arrecifes e o mar. É fácil se sentir privilegiado por estar ali. Pode abrir os braços e estampar o sorrisão porque nem mesmo uma pose cafona vai estragar a selfie.
Em seguida, o grupo para na Casa do Doce de Tambaba, uma loja construída com madeira e barro e decorada com chita, em um assentamento quilombola onde vivem 64 famílias. Lá, as plantações de abacaxi, mamão e maracujá viram doce caseiro. Há redes instaladas à sombra.
Com cerca de 60 metros de altura, o Castelo da Princesa é o próximo mirante. Trata-se de uma voçoroca à beira-mar, já na divisa da praia de Tambaba, que ganhou o nome por causa do seu formato, que lembra uma torre esculpida pelas chuvas e vento. A paisagem é bonita – a torre à frente, o oceano ao fundo – inspira poses irreverentes. Visitantes usam ilusão de óptica para fingir que está tocando o topo do castelo.
É hora da parte mais difícil do roteiro: a Barra do Graú, onde o rio encontra o mar, na divisa com o município de Pitimbu. O acesso é complicado. Há subidas e descidas, buracos na estrada de terra, mato e poeira, desnível na trilha. Avistar os coqueiros se aproximando no horizonte é um alívio.
A Barra do Graú é uma praia deserta, perfeita para um mergulho na água quente. Mais à frente fica o braço do rio, margeado pelo mangue. Um cenário que certamente faz valer a pena o esforço para chegar até ali.

CALOR E SILÊNCIO SOB O SOL DO CARIRI
A quentura é tanta que a roupa gruda no corpo. Com o sol a pino e em meio a árvores que não fazem sombra, o cabrito, costelas à mostra, sai balançando o chocalho no pescoço. Em um raio de muitos metros, é o único barulho que se ouve. Estamos em Cabaceiras, cidadezinha de 5 mil habitantes no Cariri paraibano, dona do menor índice pluviométrico do país e de uma paisagem marcada por formações geológicas raríssimas, que se sobrepõem à vegetação castigada pela seca.
O destino fica a poucos quilômetros dali: o Lajedo do Pai Mateus, principal atrativo da região.
Mesmo antes de se embrenhar na trilha que leva a rochas milenares, vale apreciar o cenário. Andar por Cabaceiras é dar de cara com o sertão duro. O chão, literalmente de terra rachada, as casas de pau a pique e o gado magrinho já atraíram muitos olhares para a cidade a 220 quilômetros da capital. Ou melhor, muitas câmeras. São mais de 30 filmes rodados nessas redondezas, entre eles o clássico nacional Auto da Compadecida (2000), que fizeram valer o apelido de Roliúde Nordestina – com direito até a letreiro, como na Hollywood americana.
Chegando mais cedo, uma boa pedida é almoçar no Hotel Fazenda Pai Mateus, com comida típica do sertão bem caprichada. De lá, partem trilhas de ecoturismo que movimentam a região. Dá até para tirar um cochilo na rede e esperar o sol esfriar um pouco. Na mochila, água, protetor solar e repelente para espantar as muriçocas – que no Cariri Velho ninguém é de enrolar a língua para falar pernilongo.
Com mais de 40 metros de altura, a Saca de Lã, primeira parada, é um monumento natural em formato de pirâmide e lembra grandes sacos de algodão, um em cima do outro. Como as pedras parecem ter sido obra planejada, a formação serve de pano para a manga de muita gente que acredita em extraterrestre. O guia Gerson Lima, de 30 anos, que não faz coro para ET nenhum, diz que foram milhares de anos para ganhar a aparência que têm. “Conforme a rocha dilata pelo calor e depois resfria, vai se fraturando em formato de amarrações – não segue uma fratura até em baixo, vai quebrando bloco por bloco.”
De cima das rochas, os olhos só alcançam o esbranquiçado da caatinga e o céu azul, azul. Há anos, o braço do Rio Boa Vista, que corre às margens da Saca de Lã e deságua no Rio Taperoá, está seco. Nas cheias, cada vez mais raras, o córrego chega a 6 metros de profundidade.
Aos poucos, o cenário muda. O carro leva até a trilha do Lajedo do Pai Mateus, nome do eremita que morou em uma das grutas e fazia rezas em troca de comida no século 18, segundo a narrativa local. A paisagem é tomada por uma imensa base de granito. Em cima dela, ficam pedras gigantes e arredondadas, os chamados matacões. Só existem formações geológicas semelhantes na África e na Austrália.
São 2,5 quilômetros a pé até o guia apontar a casa do curandeiro, que dormia e comia em cama e mesa de pedra. Na mesma gruta há pintura rupestre, vestígio dos índios cariris que habitaram a região. Marcas de mãos, um sinal de rituais de passagem, estão impressas na rocha.
O Lajedo se revela um espaço de contemplação, daqueles que fazem a gente se sentir pequeno diante do mundo. Também existem várias formações curiosas para explorar. Há a Pedra do Capacete e da Orelha, e, se você ouvir o som que faz a Pedra do Sino, também vai saber por que a chamam dessa maneira. Já na Pedra do Desejo é a oportunidade engrossar o misticismo do local e fazer uma fezinha no acaso.
Ao se deitar, o sol mancha o horizonte de laranja e lilás, em uma cena que arrancaria aplausos se o morador do Cariri fosse cabra de aplaudir o sol. Difícil não sentir a paz do lugar. O Lajedo é para quem gosta de escutar o barulho do silêncio.