Nova velha conhecida

Capital portuguesa (re)conquista turistas de todo mundo

texto: Por Mônica Nobrega/agência estado | fotos: divulgação
texto: Por Mônica Nobrega/agência estado | fotos: divulgação

Depois de meses de obras que começaram em fins de 2015, o Cais do Sodré finalmente está livre dos tapumes. Há algumas semanas exibe novo visual: calçadão, espreguiçadeiras, restaurante, café, livraria, menos carros.
A renovação de uma área importante para a história marítima da capital portuguesa representa um bom resumo da Lisboa turística de agora, essa que tem frequentado as listas de destinos mais descolados do planeta. E cujo segredo está em reinventar seu apelo por meio de um olhar contemporâneo sobre a tradição e o patrimônio.
É na velha Lisboa que está a novidade. Em bares no topo de prédios, movidos a drinques e vista dos telhados e do Rio Tejo. Na hotelaria moderninha instalada em palacetes de séculos passados. Nos hostels diferentes de outros que você já viu pelo mundo, e que fazem da capital de Portugal uma referência nesse tipo de hospedagem. Na noite lisboeta, que dá sinais de ter se cansado um pouco do Bairro Alto e busca frescor na antiga área de bordéis, degradada até pouco tempo atrás.
A onda novidadeira segue para o também histórico bairro de Belém, ponto de partida das navegações portuguesas nos séculos 15 e 16. Inaugurado em outubro, o Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT) ergueu na margem do Tejo um edifício curvilíneo branco, ostensivo quando visto do chão firme, mas quase imperceptível se observado de um barco no meio do rio.
É um contraponto à monumentalidade acrítica dos vizinhos Padrão dos Descobrimentos e Torre de Belém. Uma provocação sintonizada com este tempo em que é preciso fazer perguntas em vez de apenas celebrar os ditos conquistadores.
Do outro lado da cidade, o Parque das Nações segue sendo visitado graças ao Oceanário. Turistas vão até lá também para um passeio no teleférico que, a bem da verdade, liga nada a lugar nenhum. Mas, sem ter ainda completado 20 anos, data que será celebrada em 2018, a área já começa a envelhecer.
Representa um modelo’caduco’ de cidade, que prioriza carros e torres envidraçadas de escritórios e hotéis. Vale como um bate-volta a partir da Lisboa verdadeiramente moderna: a velha cidade-mirante assentada sobre sete colinas, caminhável e com história para contar.
Contra o calor que faz agora na Europa, terraços para comer e bebericar ao ar livre. O do Hotel Valverde, na Avenida da Liberdade, é um daqueles segredinhos locais que turista procura e não encontra nos guias. Às terças-feiras, há apresentações intimistas de fato na happy hour, mais ou menos entre 19h30 e 22h.
Outros dois desses terraços pertencem aos restaurantes Gin Lovers & Less e Atalho Real. Ambos ficam dentro da Embaixada, nome de uma galeria que reúne marcas e artistas que trabalham apenas com moda, decoração, cosméticos e artesanato portugueses. A Embaixada reaproveita um casarão de estilo árabe do século 19 e fica no bairro lisboeta que atualmente tem a cara desse tipo de empreendimento, o Príncipe Real.

Cais do Sodré finalmente está livre dos tapumes. Há algumas semanas exibe novo visual
Cais do Sodré finalmente está livre dos tapumes. Há algumas semanas exibe novo visual

SINTRA
A rede de Transporte Público dá conta das necessidades do turista. Há metrô e os fotogênicos bondinhos, chamados de elétricos. Trens suburbanos, os comboios, partem da estação Rossio, na Baixa Pombalina, centrão da cidade, para a vizinha Sintra, onde o News Museum (newsmuseum.pt; ¤ 8) foi inaugurado há pouco mais de um ano, em abril de 2016.
O museu traça uma trajetória da imprensa portuguesa e mundial por meio de um acervo quase todo virtual e interativo. São vídeos, paredes transformadas em telas sensíveis ao toque e óculos de realidade virtual com informações e curiosidades suficientes para uma tarde. Dá até para brincar de ser apresentador de televisão, com performance filmada e publicada no YouTube.
Prepare-se para mais crítica ao mundo como ele é. A exposição Macho Media, em cartaz até o fim do ano, questiona o machismo na imprensa. A histórica Lisboa tem olhado com atenção para o novo mundo. Mas de um jeito diferente.

Belém ganha traço ousado
Foi com uma ‘exposição-manifesto’, na definição da curadoria, que o Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT) inaugurou em março seu prédio mais novo. A construção branca, mais baixa que tudo ao redor e cujo formato lembra uma onda, exibiu a mostra Utopia/Distopia, uma reflexão sobre a atualidade com subtemas como as cidades do futuro.
A Lisboa do futuro que o MAAT propõe é feita para ser vista e tocada. Tem mirante no forro e, na entrada, escada que desce até as águas do rio. Neste calorão de agosto, foi refrescante sentar ali e tirar os sapatos para mergulhar os pés no Tejo.
A exposição Utopia/Distopia terminou essa semana, mas outra obra questionadora está em cartaz até 18 de setembro. Na instalação Eu Nunca Tinha Sido Surrealista Até o Dia de Hoje, o artista cubano Carlos Garaicoa explora as relações reais e imaginárias entre homem e urbanismo.
No outro prédio, este do começo do século 20, que abrigava o antigo Museu da Eletricidade, o português João Onofre usa tecnologia para brincar com a luz nos espaços urbanos, aproveitando a antiga sala das caldeiras – que está lá, exposta.
Terminada a visita ao MAAT, talvez seja o caso de curtir o fim da tarde no vizinho SUD. O empreendimento, aberto em julho, tem restaurante e uma piscina no terraço com vista para a Ponte 25 de Abril, um cartão-postal lisboeta. O acesso custa 35 euros por pessoa: sudlisboa.com.
Belém, bairro onde está o MAAT, é endereço de pontos turísticos clássicos: Torre de Belém, Padrão dos Descobrimentos, Mosteiro dos Jerônimos, a confeitaria que faz pastéis de nata desde 1837. E tem um atrativo que os turistas deixam passar: no verão, até 8 de setembro, o ótimo Centro Cultural do Belém (ccb.pt) apresenta música e cinema no jardim, gratuitamente.
Rabiscos. Do Belém, fui a pé (1,3 quilômetro; a alternativa é pegar o elétrico 15) até o LX Factory (lxfactory.com), em Alcântara. As paredes grafitadas entregam o clima geral das lojas, restaurantes, ateliês e um hostel instalados nos galpões do século 19, que foram uma tecelagem e hoje formam um dos endereços mais descolados de Lisboa.
Meu objetivo ali era comprar presentes na loja Bairro Arte (bairroarte.com) e fazer uma tatuagem no estúdio Queen of Hearts, que havia sido recomendado. Mas, sem agendamento prévio, não consegui meus rabiscos na pele. Faça o seu: bit ly/queentattoo.
Os hambúrgueres da Burger Factory estão entre os melhores da cidade, e foi em um deles que me joguei para compensar a frustração. Com batata frita e cerveja, gastei ¤ 11,50. Difícil não ser feliz.