A complexa escolha entre dois amores

Reações químicas no cérebro podem explicar o comportamento

Parece coisa de novela, mas, às vezes, a vida real apronta e, sem esperar, alguém comprometido se apaixona por uma nova pessoa e se vê dividido entre dois amores. Se essa trama é uma das legais de acompanhar na ficção, fora dela, a situação é bem mais complicada do que emocionante. O conflito pode causar muito sofrimento às partes envolvidas, já que optar por uma ou outra paixão é uma escolha complexa, que precisa da ponderação de diversos fatores.
“Quando uma pessoa fica confusa sobre quem ama, é porque cada um proporciona a ela coisas diferentes, mas igualmente boas. Por isso, ela não sabe decidir o que pesa mais” explica a psicóloga e terapeuta de casais Daniela Ervolino, do Psicolink.
De acordo com o psiquiatra e psicoterapeuta Alfredo Castro Neto, a paixão por duas ou mais pessoas se explica por reações químicas no cérebro, já que encantar-se por alguém provoca uma descarga de dopamina nos gânglios basais, estruturas associadas a emoções primitivas. No entanto, o médico diz que amar verdadeiramente mais de um é improvável, já que a ligação afetiva depende do córtex pré-frontal, área responsável pelo amadurecimento dos sentimentos e pelo controle dos impulsos, e de outro neurotransmissor, a endorfina.

poliamor

Envolvidos com várias paixões, há aqueles que se desobrigam em ficar com uma só. É o caso de quem vive o poliamor e mantém mais de um relacionamento ao mesmo tempo, como a filósofa Sharlenn Carvalho, de 33 anos. Ela é noiva do produtor Will Vaz, de 29 – os dois se conhecem desde 2012, e têm uma relação estável que dura um ano e quatro meses – e, há cinco meses, começou a sair com outro homem, de 30 anos, que ela prefere não identificar nem rotular como namorado.
“Moro com o Will e o outro vejo uma vez por semana. Mas nos falamos todo dia”, conta Sharlenn, que acha que seria muito duro ter que optar por um deles, embora admita sentir amores diferentes. “Tenho muito mais afinidade com o Will. É companheirismo, amor, paixão. Com o outro, estamos na fase do encantamento e das descobertas. Diria que estamos apaixonados. Mas é claro que pode virar amor. Nos gostamos muito, mas ainda falta intimidade”.
“No momento, (Will e o outro parceiro) não têm relacionamentos estáveis, mas saem com outras pessoas. Tenho regras diferentes com cada um. Eu e meu noivo sempre falamos de pessoas nas quais estamos interessados, mesmo que seja só para ficar. Com o outro, o acordo é avisar quando estivermos gostando afetivamente de mais alguém”, diz Sharlenn.

Sharlenn Carvalho e Will Vaz vivem um relacionamento livre Foto: Arquivo pessoal
Sharlenn Carvalho e Will Vaz vivem um relacionamento livre
Foto: Arquivo pessoal

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Autoavaliação é o ponto-chave para tomar decisão

Como nunca se ama dois ou mais indivíduos pela mesma razão, para escolher um deles, é preciso ver com quem se tem mais afinidades, orienta a psicóloga Daniela Ervolino: “se não for comum acordo ter um relacionamento aberto, a pessoa apaixonada por mais de um se sente culpada e envolta em mentiras, se já mantiver um amante e um parceiro oficial. Para acabar com o conflito, ela vai ter que tomar a decisão se fica com um ou outro ou nenhum, e, para isso, é preciso pesar o que é prioridade naquele momento”.
Segundo o psiquiatra Alfredo Castro Neto, exercitar o pensamento crítico, o senso de julgamento e o poder de antecipação de situações é essencial para fazer a escolha certa.
“A pessoa tem que fazer uma autoavaliação adequada. Deve centrar-se em si mesma e procurar conversar sobre o problema com quem ela tem confiança”, aconselha.
Já para a psicanalista e escritora Regina Navarro Lins, modelos de relacionamento que não exigem tal decisão, como o poliamor, tendem a se tornar mais comuns.
“As mentalidades estão mudando. O amor romântico, que prega a fusão entre os amados, está dando sinais de que vai sair de cena e levar com ele a exigência de exclusividade”, diz a especialista, que atribui isso à valorização das individualidades. “Não é que um modelo vai substituir o outro (tradicional), mas cada um deve escolher a melhor forma de viver”.