Rumo ao Sul: Peru

Entre luzes e vulcões, Islândia é a preferida

28 - Peru

Machu Picchu é o maior ímã de turistas no Peru. Mas, a despeito de ser seu patrimônio mais famoso, não é o único que justifica uma viagem ao território vizinho. Dono de um fabuloso painel de cultura e história originais, de aclamada gastronomia e com infraestrutura de serviços em expansão, o país revela ano a ano mais argumentos para convencer os brasileiros a apostar nele como destino de férias de longo alcance ou mesmo para bate-volta estratégico.
O tempo disponível, seja ele qual for, nunca será suficiente para dar conta de tudo. Vai servir, porém, para você prometer a si mesmo que um dia voltará.
Neste recorte feito em sete dias de viagem pelo repórter-fotográfico Werther Santana, o roteiro contempla Lima, a capital e principal porta de entrada no país, e privilegia alguns dos principais tesouros turísticos guardados na parte sul do território.
Ali destacam-se o balneário de Paracas, uma reserva natural protegida, lar de aves e animais marinhos, de paisagens esculpidas pelo vento e, segundo a mitologia de seus ocupantes ancestrais, pela fúria dos deuses.
Na tentativa de aplacar a inapelável ira divina, manifestada em tormentas e terremotos, as populações originais ergueram templos, construíram huacas (locais dedicados a cultos), rabiscaram o deserto com figuras trapezoidais e zoomorfas. Até hoje estudiosos se debruçam em teorias sobre as Linhas de Nazca, emaranhado de desenhos espalhado na vastidão desértica entre litoral e cordilheira. Um dos grandes mistérios jamais desvendados é também combustível turístico de desenvolvimento regional.

 

PARTIU LIMA
Demorou, mas enfim a capital peruana superou a síndrome de baixa estima que a acometeu desde meados do século 19 e se mostra, hoje, uma cidade versátil para os turistas. Prefira hospedar-se nos bairros de San Isidro, Miraflores e Barranco, onde se concentra o melhor da rede hoteleira e o circuito de bares e restaurantes. Por ali também há ateliês e centros culturais. Nessa região, a vida corre solta no passeio à beira-mar, em áreas verdes urbanizadas, ciclovias e espaços públicos com Wi-Fi livre.
No coração da metrópole de dez milhões de pessoas, a Plaza Mayor é o resumo de sua história colonial e republicana. Ali está a Catedral onde descansa Francisco Pizarro, o anti-herói errante que subjugou nativos e fez de Lima, em 1532, “a Cidade dos Reis”, o principal centro irradiador de cultura hispânica na América do Sul até se tornar a capital de um país independente pelas mãos e pela espada de José de San Martín.
Cidade adentro, sítios arqueológicos testemunham uma ocupação contínua desde muito antes da chegada dos espanhóis. Um deles, a Huaca Pucllana, desponta assombrosamente em Miraflores e serve como aperitivo para novas descobertas.
E Machu Picchu? Bem, a cidadela sempre estará lá, esperando por sua visita. Você pode se inspirar no link oesta.do/machu-pi, nossa última incursão, a pé, pelo famoso sítio arqueológico. Ou com uma bela galeria de fotos: oesta.do/machuecuzco.

 

CONVÍVIO ABERTO
Ao menos três espaços públicos em Lima fornecem entretenimento e diversão para todas as idades, misturando os turistas ao cotidiano dos moradores. Às bordas do Pacífico, o Parque del Amor é referência em Miraflores, o mais lírico dos bairros da capital peruana, cenário para personagens de Mario Vargas Llosa, Martín Adán e Alfredo Bryce Echenique, entre outros autores. Ao centro do paço cercado por bancos que remetem ao Parc Güell, idealizado por Gaudí em Barcelona, está a escultura El Beso, de Victor Delfin. No coração daquela que um dia foi chamada de ‘Cidade dos Reis’, a Plaza de Armas reúne o conjunto colonial mais emblemático do país. Ali estão a Catedral, os prédios governamentais, o centro do poder, os casarões enfeitados com balcões talhados em madeira, o vaivém da metrópole. Ao anoitecer, parte de Lima migra para o Parque La Reserva, onde o show de águas e luzes arranca sorrisos de adultos e crianças em uma sequência de fontes e projeções carregada de poesia.

 

MUCHO GUSTO
A “peruanidade” se expressa mais intensamente nas culturas originárias apreciadas em museus e sítios arqueológicos e também na gastronomia servida em restaurantes de fama internacional. No primeiro caso, é preciso eleger ao menos um dentre os bons museus de Lima. O acervo do Larco, na Avenida Bolívar, eixo central da cidade, traz um amplo apanhado das culturas que floresceram no território sul-americano há cerca de três mil anos. São mais de 47 mil peças, correspondentes a diferentes períodos, colecionadas por Rafael Larco Herrera, um dos pais da arqueologia peruana. Ingresso a 30 soles (R$ 26) por pessoa.

Plaza Mayor é um ponto turístico de sua história colonial
Plaza Mayor é um ponto turístico de sua história colonial

 
Quanto aos verbos comer e beber, bem, você não terá dificuldade nenhuma em conjugá-los em casas como La Mar, Rosa Náutica, Pescados Capitales, Astrid & Gastón, Central e Señorío de Sulco, entre outras. Se quiser uma experiência clássica das altas rodas peruanas, a Hacienda Los Ficus (haciendalosficus.com) promove apresentações de cavalo de passo com menu completo a US$ 85 por pessoa. O balé equestre ocorre duas vezes ao dia, às 12h30 e às 16h30. À noite, além do circuito de bares, Lima reserva cassinos como o Atlantic City, em Miraflores.

 

FÚRIA DIVINA
A terra estremece quase diariamente na costa sul-americana do Pacífico, região assentada sobre placas tectônicas de humor cambaleante. Muito tempo antes da chegada dos ibéricos ao continente, há cerca de três mil anos, civilizações já se organizavam para fazer de uma região então inóspita seu lar. Tiveram a todo custo de superar os desafios impostos pelo meio, o que implicava se virar com o que tinham à mão. Assim foi feito, ocuparam os vales formados pelo degelo das neves andinas, onde fluem rios e, portanto, o suprimento de água doce estava garantido.
Nesses oásis sul-americanos surgiram cidades feitas do barro e das pedras, materiais disponíveis em uma região árida em que o ciclo sazonal de chuvas é imprevisivelmente ditado pelo fenômeno hoje conhecido como El Niño. Criaram sistemas de canalização de lençóis freáticos para o abastecimento da população. Ergueram robustas pirâmides escalonadas. De quando em quando, porém, ora terremotos, ora tempestades destruíam parte do que haviam feito.
Era preciso aplacar a ira dos deuses. Em especial, as ânsias de Pachacámac, a divindade mais adorada e temida do litoral sul peruano desde tempos pré-incaicos – o culto seguiu até a chegada de Pizarro. A 40 quilômetros de Lima, o sítio arqueológico que leva o nome do deus pré-hispânico conta a história.
Testemunho da resistência e da veneração do homem face às forças naturais. A entrada custa 10 soles (R$ 8,70), há um pequeno museu e uma lojinha no local. Mais: pachacamac.cultura.pe.barro.

 

TERRA
Paracas é um santuário natural a meio caminho entre Lima e Arequipa, as duas maiores cidades peruanas. Da capital, fica a cerca de 4 horas de carro, o que faz dele um destino viável para um fim de semana prolongado. É daqueles redutos que a gente imagina ter de inventar para se desplugar da correria urbana. Mas nem precisa: ele está lá, prontinho para ser explorado.
É possível combinar um roteiro com Paracas e tours de barco de manhã e, ao entardecer, passeios de tubulares (um tipo de buggy) pelo Deserto de Ica – com tempo, você pode separar as atividades em dois dias. A vista é de perder o fôlego: quilômetros e quilômetros de dunas que parecem não ter fim. No fim do dia, a suavidade da luz ao pôr do sol proporciona fotos únicas. Os guias costumam levar pranchas de sandboard para os turistas se arriscarem nas montanhas de areia de até 40 metros. O passeio de tubular com sandboard custa cerca de 85 novos soles (R$ 73).

Em Paracas é possível combinar passeios de barco com buggy
Em Paracas é possível combinar passeios de barco com buggy

 

ÁGUA
Escolhida como lar por uma fauna diversificada, Paracas reúne em seus domínios sob proteção ambiental colônias de pinguins, centenas de aves marinhas, grupos de golfinhos e de lobos-marinhos, entre outras espécies. A bicharada vive em meio a paisagens esculpidas pelo vento e pela força do mar. Uma das formações rochosas icônicas do pedaço atende por Catedral – e, sim, faz por merecer tal alcunha. O melhor jeito de apreciá-la é de barco (em média, US$ 28), passeio que também dá a oportunidade de conhecer as Ilhas Ballestras e o Candelabro, um intrigante e gigantesco desenho de 150 metros de altura e 50 de largura atribuído aos antigos habitantes da região – ali viveram culturas como a paracas, famosa pela produção de mantos e túnicas de algodão com padrões únicos, e a nazca, responsável por construir complexos sistemas hidráulicos em zonas desérticas e legar à humanidade um imenso ponto de interrogação até hoje indecifrado, conhecido como Linhas de Nazca.

 

Ar
Em um dia desses em que as nuvens tiram folga e deixam o céu cintilar em azul, um piloto que sobrevoava a imensidão desértica que cobre o sul do Peru entre o Pacífico e os Andes viu o que até então ninguém havia imaginado: um emaranhado de desenhos rabiscava o solo em todas as direções. Era 1930, época em que aéreas comerciais começaram a atravessar a região, que já havia recebido uma estrada – a pista foi aberta em meio a esses intrigantes desenhos.
Antropólogos passaram a estudá-los, identificando a data aproximada em que foram sistematicamente produzidos (há cerca de 1,5 mil anos), mas, até hoje, nunca puderam explicar sua função. Muitas teorias foram elaboradas e especular sobre elas é um dos passatempos favoritos de quem as visita. As Linhas de Nazca só podem ser observadas do alto – além de alguns mirantes abertos ao público na região, voos em monomotor decolam todos os dias do aeroporto local. Duram em média meia hora e perfazem figuras geométricas e zoomorfas – tem aranha, baleia, macaco, colibri, condor e muito mais. A partir de US$ 100 por passageiro.